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Um Susto de Filme/Scary Movie
Realizado por Keenan Ivory Wayans
EUA, 2000 Cor – 88 min. Anamórfico.

Com: Jon Abrahams, Carmen Electra, Shannon Elizabeth, Anna Faris, Kurt Fuller, Regina Hall, Lochlyn Munro, Cheri Oteri, Dave Sheridan, Marlon Wayans, Shawn Wayans

Um indivíduo mascarado dedica-se a assassinar os inconscientes adolescentes de um liceu norte-americano. O assassino viu demasiados filmes de horror, as vítimas, aparentemente, não.

«Scary Movie» segue de perto a estrutura de «Scream» (1997), mas recorre a imensas cenas de diversos outros filmes para criar o seu humor. «Scream» (cujo título de rodagem foi precisamente «Scary Movie») era já uma sátira, se bem que apresentado num registo sério, tentando alimentar-se tanto dos clichés dos “slashers” incoerentes, que jorraram profusamente pela torneira hollywoodesca abaixo, nos anos 80, como ser um filme de horror por mérito próprio. Pode a sátira de uma sátira funcionar?

O filme dos irmãos Wayans (Marlon, Shawn e Keenan; Damon, o quarto elemento, estava ocupado a trabalhar no novo filme de Spike Lee) pega no “mau gosto maroto” que os Farrelly, em «There's Something About Mary» (1998), já tinham empurrado para novos limites e polvilha-o ao longo do filme, numa série de piadas de gases, fluidos corporais e partes bamboleantes. É aqui que se demonstra que a contenção e o contexto são essenciais, pois o filme dos Farrelly insere estes elementos no seio de uma história e de personagens que o espectador quer acompanhar até ao fim do filme. Aqui, temos pouco mais do que a soma de partes soltas (trocadilho não intencionado), o desenrolar de graçolas e de piscar de olhos a filmes que quase toda a gente conhece. O filme não se aguenta como um todo coerente.

É também notória a existência de dois argumentos, posteriormente assimilados num único. Uma linha de construção centrava-se mais na blaxploitation e nas personagens negras (sobram ainda imensas tiradas de “humor étnico”), e seria mais coerente com a obra anterior dos Wayans, «I'm Gonna Get You Sucka!». O facto de existirem mais quatro argumentistas creditados, para além de Shawn e Marlon, será revelador de um processo de revisão e de optimização do filme para uma audiência mais colorida e, consequentemente, mais extensa.

Os cineastas alegarão que não quiseram senão entreter a audiência durante 90 minutos, e a verdade é que muitos momentos provocam gargalhadas, de variados decibéis. Aparte meia dúzia de momentos genuinamente divertidos, a maior parte do filme dedica-se ao efeito de “olha aquilo é do Matrix; olha aquilo é do Scream”, ou seja, reproduzir e exagerar cenas populares, sem que a graça esteja sempre presente. Há situações que são levadas a tais limites que nos perguntamos porque é que não desistem, como quando a vítima vai sendo retalhada e persiste numa atitude de desafio ou a cena da dança anti-gravitacional.

Além das óbvias referências a filmes de terror recentes (porque a memória do público é muito limitada), outras há que não parecem funcionar com audiência de «Scary Movie», como «Os Suspeitos do Costume» (1995), que, estranhamente, não criou qualquer reacção de reconhecimento. Talvez por ser um filme destinado a um público mais maduro?

Quanto ao teor do filme, é curioso apontar que os cineastas se congratulam com o facto de se abusar dos limites do que é tolerável num filme mainstream. Numa entrevista à Premiere francesa, afirmam que os censores deixam passar coisas inaceitáveis noutro contexto, ou seja, como é comédia não há problema nenhum. Já um ménage a trois num filme como «American Psycho» precisa de um corte para evitar ser interdito a menores.

Por cá, continua a ser óbvio que a Comissão de Classificação precisa de urgentes reformas, se considera que este filme deve ser visto por Maiores de 12 anos, com a apresentação de genitais (ainda que falsos) usados como armas mortais ou pêndulos hipnóticos e fluidos sexuais abundantes. Principalmente sabendo que um “M/12” e um título como «Um Susto de Filme» convidam crianças de 8 ou 9 anos a deslocarem-se às salas, e que os exibidores têm mais que fazer do que chatear os miúdos. Mais grave, talvez, é a ignorância dos pais que acompanham as crianças a virtualmente qualquer coisa em exibição e que lhes parece “apropriado”.

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Publicado on-line em 10/12/00.