O Fantasporto 99 decorreu oficialmente entre os dias 25 de Fevereiro e 6 de Março. Se o lema do ano passado era "a maioridade" (18, estão a ver?), o deste ano é "para o ano são 20", ou seja continua-se a denotar um certo orgulho de "estar há muito tempo nisto" por parte da organização.
Uma certa desorganização também é patente, de uma forma ou de outra, ano após ano, e nem tudo se aceita devido à envergadura do evento ou à necessidade de improvisar face à recepção tardia de algumas cópias. O ano passado programaram-se demasiados filmes pouco interessantes. Admitindo o erro, decidiu-se reduzir o número de sessões e de filmes. Quanto aos filmes, não poderíamos discordar, até porque o essencial é uma boa selecção. No que diz respeito à construção dos horários das sessões não poderíamos estar mais insatisfeitos. Filmes como «Pi» e «Society» passaram provavelmente uma única vez e ao mesmo tempo, enquanto o Auditório Nacional Carlos Alberto e três salas do AMC/Arrábida exibiam filmes extra-festival, como «Dragon Ball Z» ou «Space Jam».
Parece óbvio que seria de desejar uma boa selecção de filmes, com boas alternativas de aceder às respectivas exibições. A secção Fantásia, por seu lado, finalizou na terça-feira! As pessoas que passassem um fim de semana no Porto (mesmo bem alargado) não podiam ver nenhum filme, para além dos premiados (Anime e Imagem Real), que - surpresa! - foram exibidos ao mesmo tempo, um no Rivoli às 16:15 e outro no AMC às 16:20 de domingo.
Quanto à programação das sessões ficámos, portanto, pela mediocridade.
Ainda no que diz respeito à possibilidade de melhor seleccionar os diversos filmes, continua-se à espera das prometidas sessões tardias. Os últimos filmes eram exibidos às 23, durante a semana, e à 1 da manhã ao fim de semana. Talvez o Fantasporto tenha um acordo com os bares e discotecas da Invicta…
Seria mais proveitoso para quem não reside no Porto, mas também para quem por lá está durante todo o festival, se, por exemplo, as três salas do AMC funcionassem como sessões alternativas das diferentes secções (Fantásia, Fantástico/Competição, Semana dos Realizadores). Os filmes extra-festival ainda ficariam com o ANCA e o Central Shopping.
Um cinéfilo, procurando o horário de «I Still Know What You Did Last Summer», é distraído momentaneamente pelo conceito de um preservativo assassino. |
Não há como evitar falar neste pequeno… detalhe. O público mais "intelectual" gosta dos filmes pelo conteúdo (claro), não se coibindo de, de quando em vez, se debruçar, fascinado, com a beleza plástica dos enquadramentos. Mas é estranho que o ilustre júri premeie filmes como «Happiness» ou «Cube» sem se lembrar de dizer ao projeccionista que mude de profissão ou - OK, sejamos tolerantes - que mude o enquadramento. Porque entre «Society», «Happiness» e «Very Bad Things/Eram Todos Bons Rapazes» apareceram 20 ou 30 microfones e até projectores. Isto sem qualquer exagero. Não estamos já naquela situação em que "só tu é que viste", mas num quadro em que metade do público passa o filme a apontar objectos para a outra metade. Micros com pé, felpudos, de cores variadas; grandes e pequenos. Podia-se alegar que até se vê mais um bocado do rabo da prostituta de «Very Bad Things» (Carla Scott) ou de Jane Adams em «Happiness», mas não há nada que nos faça perdoar tão incompreensível ignorância por parte do(s) projeccionista(s) de um dos "melhores festivais de cinema do mundo".
O dito senhor concordaria connosco quando dizemos que o 16:9 não é o formato do cinema, mas a conclusão seria outra: o formato do cinema e o formato actual da TV são exactamente a mesma coisa. A estranheza do desconhecimento do formato standard 1.85:1 (não pode ser insuficiência técnica numa sala renovada há relativamente pouco tempo) era premente no esforço que se fazia para remover a abismal quantidade de microfones que surgiam na película. Puxava-se o filme totalmente para cima. Aliás, subir e descer a película era algo que se fazia em todos os filmes. Algumas cenas de «Karmina» e de «Cube» surgiram com toda a gente de cabeça cortada.
Costuma-se dizer que com scope e animação é impossível falhar. No primeiro caso é projecção "full frame" com uma lente que descomprime e duplica a imagem, e no segundo não se desenha para fora do enquadramento de projecção por óbvias razões económicas. Ora ainda assim se conseguiu exibir a curta «Carne» em distorção durante cinco minutos (sem a lente scope), até que alguém - provavelmente o actor Phlippe Nahon, presente na sala - chamou a atenção para o facto (o praguejar parecia ter sotaque). Na verdade, durante algum tempo, e dado o registo do filme, a distorção poderia passar por tratamento estético. Quanto à animação, «Jin Roh» foi exibido em algo como 2:1, logo ligeiramente cortado acima e abaixo. E lá o senhor subia e descia a imagem.
Martin Walz comentando como era engraçado «Killer Condom»: passado nos EUA, toda a gente fala em Alemão. Deixou de ter piada quando se descobriu que a cópia não era legendada. |
Como tal iremos enviar um desenho para a organização e para o Rivoli.
Esta é a parte positiva deste texto. No fundo é a única coisa que importa. Tudo o que funciona em redor, ou seja aquilo que nos permite aceder-lhes, não funciona ou funciona mal. Se nos focarmos nas obras visionadas ficamos muito mais bem dispostos, porque a qualidade média foi elevada. E este ano, para variar, ficou a sensação de que muito ficou por ver. E ficou mesmo. «Divorcing Jack», «Last Night», «Love is the Devil», «Kingdom 2» ou «The Quiet Family», de entre os agraciados pelos júris do festival, ou «DANGAN Runner», «Bullet Ballet», «Progeny» e «Seul Contre Tous», de entre os restantes.
De resto, como é hábito, a maioria dos filmes não tem distribuidor nacional.
«Kondom des Grauens/Killer Condom», Martin Walz (Alemanha/Suiça, 1996)
«Karmina», Gabriel Pelletier (Canadá, 1996)
«Society», Brian Yuzna (EUA, 1989)
«Very Bad Things/Eram Todos Bons Rapazes», Peter Berg (EUA, 1998)
«Happiness», Tod Solondz (EUA, 1998) (Melhor Filme, Semana dos Realizadores)
«Cube», Vicenzo Natali (Canadá, 1998) (Grande Prémio)
«Jin Roh», Hiroyuki Okiura (Japão, 1998) (Melhor Filme Anime, Secção FantÁsia)
As curtas:
«The Wager», Aaron Woodley (Canadá, 1998)
«Ciro Norte», Erich Breuer (Chile, 1998)
«Hi-Fi», Ivan Cardoso (Brasil, 1998)
«On Edge», Frazer Lee (Reino Unido, 1998)
«Carne», Gaspar Noé (França, 1991)
«Trigon», Niklas Roy (Alemanha, 1997) (Melhor Curta Metragem)
Secção Oficial Fantástico
- Grande Prémio: «Cube», Vincenzo Natali (Canadá);
- Prémio Especial do Júri (ex-aequo): «Money, a Mithology of Darkness», Vassilis Mazomenos (Grécia) e «Jin Roh», de Hiroyuki Okiura (Japão);
- Melhor Realização - "The Kingdom 2", de Lars von Trier (Dinamarca);
- Melhor actor (ex-aequo): Kevin McKidd e Gary McCormack, «The Acid House" (Reino Unido);
- Melhor Actriz: Sophie Grabol em «Credo» (Dinamarca);
Menção especial: Dalila Carmo por «O Anjo da Guarda» (Portugal);
- Melhor Argumento: Lars von Trier e Niels Vorsel, «The Kingdom 2» (Dinamarca);
- Melhores Efeitos Especiais: Bob Munroe e John Mariella, «Cube» (Canadá);
- Melhor Curta-Metragem: «Trigon», Niklas Roy (Alemanha);
- Prémio Méliès d'Argent (melhor filme fantástico europeu): «The Acid House», Paul McGuigan (Reino Unido)
Mário Dorminski e Beatriz Pacheco Pereira. Talvez para o ano pudessem contratar Manuel Luis Goucha e Alexandra Lencastre, para apresentarem a sessão de encerramento, com textos bem estudados, nem que recorressem a um teleponto. |
Secção FantÁsia
- Melhor Filme (imagem real) - «The Quiet Family», Kim Ji-Woon (Coreia do Sul);
- Melhor Filme (animação) - «Jin-Roh», Hiroyuki Okiura (Japão)
Prémios não oficiais
- Prémio da Crítica: «Divorcing Jack», David Caffrey (Reino Unido);
- Prémio do Público: «Cube», Vicenzo Natali (Canadá);
- Prémio AMC: «The Acid House», Paul McGuigan (Reino Unido);
- Prémios pela carreira: Júlio Bressane (Brasil) e Bill Plympton (EUA)
18/3/99
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