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Cubo/Cube
Realizado por Vicenzo Natali
Canadá, 1997 Cor - 90 min

Com: Nicole de Boer, Nicky Guadagni, David Hewlett, Andrew Miller, Julian Richings, Wayne Robson, Maurice Dean Wint

Seis pessoas, sem qualquer relação aparente entre elas, acordam um dia numa gigantesca e labiríntica prisão, formada por cubos ligados entre si. Não sabem quem os raptou (ou o quê), nem qual o motivo. Os prisioneiros podem movimentar-se entre as diversas salas, mas muitas revelam-se armadilhadas, proporcionando algumas mortes imaginativas e com alguns requintes de sadismo. Há que descobrir padrões que permitam saber quais os cubos por onde se pode passar sem arriscar a vida, bem como o caminho para a saída (admitindo-se que existe). Essa tarefa começa por parecer mais indicada para Leaven (de Boer), brilhante estudante de matemática, mas os problemas elevam-se ao cubo. Os outros prisioneiros são Holloway (Guadagni), Worth (Hewlett), Kazan (Miller), Rennes (Robson) e Quentin (Dean Witt), que têm profissões diversas - uma médica, um polícia, etc. (Os personagens foram baptizados a partir de prisões, como Leavenworth e San Quentin)

«Cube» foi o vencedor do Grande Prémio da edição de 1999 do Fantasporto, Secção Oficial Competitiva, a qual (ainda) se reserva ao cinema fantástico. Abre com uma das mais interessantes sequências que o género proporcionou nos últimos tempos. Toma o seu tempo, cria atmosfera, introduz o cenário e maravilha o espectador. O conteúdo da sequência introdutória - sem grande relevo para a narrativa que se segue pós-créditos iniciais - será aquilo pelo que este filme mais será recordado (o que sucede especificamente fica guardado para quem tiver oportunidade de o ver - e não admirará se, tal como «Retroactive», o vencedor do ano passado, «Cube» não venha a ser comprado para edição vídeo, e aqui o dano será menor, já que não se utiliza écran largo -, mas previne-se que é "natural" que a maioria dos textos referentes a esta obra façam questão de descrever a cena em pormenor).

O melhor de «Cube» é o seu conceito e o aproveitamento que se faz do cenário. Afinal não é preciso muito mais do que uma única sala em forma de cubo, iluminada com diferentes cores, para dar a impressão de que se passa por dezenas de salas diferentes. Pelo início somos impelidos a ter algum interesse pelas causas, mas cedo compreendemos que tal é secundário, e que são os efeitos apenas o que interessa, se bem que seja relativamente óbvio que se trata de alguma espécie de experiência, e que os personagens serão cobaias humanas. Mas, se eles perderam as memórias mais recentes (em particular em relação ao modo como foram ali parar), também podemos colocar uma série de outras hipóteses, incluindo até tratarem-se de verdadeiros condenados, a cumprir uma pena legítima, sob a autoridade de determinado Estado, num futuro próximo (não há referências a nacionalidades no filme, como parece ser apanágio em produções Canadianas Anglófonas, para assim melhor se penetrar no mercado dos EUA). Mas isto são meras especulações para confundir o leitor, que, se chegar ao fim do filme, concluirá que é um "debate" irrelevante, apesar de se admitir que a busca pelas hipóteses mais remotas e disparatadas poderá ser divertida q.b., mesmo que não constitua o momento alto de uma qualquer reunião social.

Uma das conclusões que se pode tirar do filme de Natali, cujos créditos prévios incluem episódios da série Psi Factor (exibida pela TVI entre nós) e uma curta que estaria na génese desta sua primeira longa metragem - «Elevated» (1997), em que três pessoas estão presas num elevador avariado -, é que funcionaria melhor num formato mais curto. Daí a curiosidade em ver «Elevated». É que o ponto de partida de «Cube» é muito sedutor e o design de produção minimalista extremamente adequado (tem de se admitir ser complicado suster a atenção do público durante hora e meia, sobre o que é, afinal, sempre o mesmo cenário), mas parece que já espremeu todo o sumo quando se chega ao meio do filme.

Dado que estamos numa labirinto com múltiplas armadilhas, e que os personagens atravessam dezenas de salas, seria de esperar que se continuasse a apresentar algo de diferente, com uma certa regularidade (nomeadamente mais algumas mutilações imaginativas). Mas, depois de surgir um par de situações de perigo com consequências verdadeiramente nocivas para o físico das vítimas, a que se adiciona mais um par de situações de tensão, resta apenas o overacting de alguns actores e uma série de voltas de 180 graus na história muito forçadas (sem fazer pisca, nem abrandando nas curvas). Um dos exemplos mais lamentáveis diz respeito ao comportamento de um personagem, que se torna psicótico sem razão e no destino que se reserva a outros, por razões que parecem ser apenas de surpreender (irritando) o espectador.

A escassez de desenvolvimento e de pormenores a partir do meio do filme, tornam duplamente decepcionante o final, cujos contornos gerais o espectador não pode deixar de esperar desde muito cedo. Essa previsibilidade não é um defeito em si. O defeito é não existir nada mais que enriqueça o filme e que compense o anúncio precoce de tal conclusão.

***
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Publicado on-line em 3/5/99.