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Eram Todos Bons Rapazes/Very Bad Things
Realizado por Peter Berg
EUA, 1998 Cor - 100 min.

Com: Christian Slater, Cameron Diaz, Daniel Stern, Jeanne Tripplehorn, Jon Favreau, Jeremy Piven, Leland Orser, Lawrence Pressman, Joey Zimmerman, Tyler Malinger

Kyle (Favreau) e Laura (Diaz) vão casar em breve. Ela não pensa em outra coisa, como se todo o objectivo da sua vida fosse a consumação desse acto. Ele é levado pelos amigos a uma despedida de solteiro em Las Vegas. Robert Boyd (Slater), Charles (Orser) e os irmãos Berkow, Adam (Stern) e Michael (Piven), acompanham-no. Jogo, álcool, drogas, e a obrigatória prostituta, fomentam o arranque para uma série de "coisas muitas más". Há um acidente e os cadáveres começam a amontoar-se. Da necessidade de encobrir crimes vão surgir as fricções que vão pôr à prova relações de amizade (?) e familiares e provocar o colapso da moral e dos bons costumes.

«Very Bad Things» é um filme delicioso. É um film noir, que segue uma certa tendência actual do cinema Americano independente - e não só (mas que filmes são, de facto, independentes?) - de alargar os limites do que é "admissível" mostrar num filme destinado a um público vasto, a nível das imagens ou dos conteúdos. Apenas considerar que aquilo que antes se tentava evitar é agora lucrativo pode justificar que um estúdio Americano - ainda que a chancela seja "apenas" da PolyGram Filmed Entertainment - tenha deixado Peter Berg levar a sua avante (é difícil de imaginar que algum corte tenha sido imposto, mas nunca se pode pôr essa hipótese de parte).

A estreia na realização de Berg, mais conhecido como o rapaz da província humilhado por Linda Fiorentino em «A Última Sedução» (1994), poderá denotar o desejo de querer "fazer" e "mostrar" muito, patente em muitas primeiras obras, mas o resultado final é razoavelmente consistente, tendo em conta que o objectivo é gozar e abusar das convenções e limites do género. Nestes termos, não pode deixar de nos fazer lembrar «Wild Things» (ainda de 98), de John MacNaughton. É inevitável que as principais críticas se debrucem sobre o exagero e a desproporcionalidade que percorre esta obra, tal como aconteceu com o filme de MacNaughton, mas esses elementos são centrais ao filme, e, possivelmente, o próprio ponto de partida. Que seria de «Very Bad Things» sem o exagero das situações, sem a ridícula violência, sem as reviravoltas no estado de espírito dos personagens e sem o tom negro e o humor tão retorcido? Um thriller engraçadinho como muitos outros? Aliás, a presença de Cameron Diaz e o rótulo "comédia" vão inevitavelmente enganar muitas pessoas. Só falta que a CCE remate com um M/12 para contribuir para subverter algumas almas desprevenidas (sim, sim, vá lá). (*)

Quando se fala em humor retorcido, fala-se mesmo de humor retorcido. O filme de Berg, apresentado na sessão de encerramento do Fantasporto 99, começa de modo algo similar a «Shallow Grave» (1994), onde há um cadáver e muito dinheiro, mas sem o factor capital. Se bem que, bom, o dinheiro venha a ter alguma importância no desenvolvimento de algumas situações secundárias. Pelo caminho, insere-se uma piada sobre formalidades religiosas decalcada de «A Chinese Ghost Story 3» (1991), de Ching Siu-Tung (coincidência, provavelmente), onde o humor já escurece de forma a desafiar a arte de David Hennings, o cinematógrafo de serviço.

Um dos melhores trunfos de «Very Bad Things», escrito pelo realizador, é pôr-nos a rir desenfreadamente com situações grotescas e de um sadismo pouco frequente até que, eventualmente, nos apercebemos do que é que nos estamos a rir. Estamos de tal forma "treinados" que, quando se aproxima o climax, estamos à espera de algo que aligeire o ambiente, de uma conclusão que "resolva" as coisas de determinada forma e que nos coloque a consciência em paz, mas tal nunca virá a suceder. Ou talvez venha… Depende do estado de espírito e da sensibilidade de cada um.

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Publicado on-line em 18/3/99.

P.S.: A CCE atribuiu um M/16, a classificação mais natural. Se não pensarmos que a «Saving Private Ryan» foi atribuido um M/12, claro.