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Celebridades/Celebrity
Realizado por Woody Allen
EUA, 1998 P/b - 113 min.

Com: Hank Azaria, Kenneth Branagh, Judy Davis, Leonardo DiCaprio, Melanie Griffith, Famke Janssen, Michael Lerner, Joe Mantegna, Bebe Neuwirth, Winona Ryder, Charlize Theron

Lee Simon (Branagh) é um escritor frustrado a atravessar uma profunda crise. Abandona a mulher, Robin (Davis), e persegue as atracções momentâneas por uma série de mulheres, onde se incluem uma supermodelo (Theron), uma jovem aspirante a actriz (Ryder) e uma editora (Janssen). A certa altura considera transformar o seu romance inacabado num guião cinematográfico, já que as pessoas cada vez se interessam menos por literatura. Robin, entretanto, procura adaptar-se a um estilo de vida diverso, consequência do fim do casamento com Lee, quando conhece Tony (Mantegna), um produtor de TV.

«Celebrity» decepcionou muito boa gente que esperava um mordaz retrato dos meandros de Hollywood, por parte de um realizador cuja própria vida pessoal tem dado alguns dos "melhores" títulos nas secções de coscuvilhice dos jornais. Não é falso dizer que o filme de Allen se debruça sobre a vida privada de algumas estrelas fictícias do mundo do espectáculo, mas não há propriamente grande esforço na elaboração de qualquer espécie de "manifesto". Em vez de crítica mordaz, dão-se algumas mordedelas numa ou noutra canela. Não houve um compromisso em entregar um complexo ensaio sobre as intrigas dos bastidores ou sobre os comportamentos, por vezes aberrantes, das estrelas, mas o título talvez sugerisse algo nesse sentido (e o nacional pluraliza, talvez para nos convencer que há mais pelo mesmo preço).

A não existência de um tratado sobre o estatuto da "estrela", ou o fracasso de tal tarefa, não é o que mais desilude neste fílme de Woody Allen, mas apenas o facto de estar alguns furos abaixo dos momentos de grande inspiração dos recentes «Deconstructing Harry» (1997) ou «Mighty Aphrodite» (1995). Colocando-o de forma bem simples: não tem muita piada. E o potencial está todo lá, em particular com a personagem de Judy Davis (bem mais interessante que o de Branagh) e o modo como se desenvolve a terapia após o abandono do marido e a aparente impossibilidade em lidar com a mudança. Professora e dona de casa, convencida da estabilidade e invariabilidade do seu dia a dia, quase sucumbe a tal choque. É profundamente Católica (a terapia é feita sob o controle de uma instituição religiosa) e sexualmente reprimida. É difícil de imaginar que Allen não conseguisse extrair melhores momentos a partir desta personagem. Apesar da aula (com uma "profissional"), para tentar melhorar a sua performance sexual, ser um momento divertido, até a punchline parece ser introduzida fora do sítio. Com o filme mais centrado em Judy Davis os resultados poderiam ser bem mais interessantes. A actriz é, de qualquer forma, o melhor de «Celebrity».

Woody Allen tem conseguido gerir a sua carreira com habilidade, jogando com variações formais que lhe permitiram continuar a fazer o mesmo género de filmes sem cair na repetição. Com «Poderosa Afrodite» colocou um personagem feminino no centro da narrativa, apesar de continuar a ser o seu olhar a guiar o espectador, e começou a usar uma linguagem mais "forte", que reforçava o efeito cómico das cenas entre "ele" e a prostituta, maravilhosamente retratada por Mira Sorvino (num papel que lhe valeria um Oscar e o estatuto de estrela de primeira linha). Em «Toda a Gente Diz que Te Amo» (1996) explorou as potencialidades do formato musical, com relativo sucesso, apesar de não estar ao nível dos seus melhores trabalhos. «Deconstructing Harry», com os personagens de ficção a assediar o seu criador, ao mesmo tempo que no-lo vão dando a conhecer, pontuado por um desenvolvimento ainda mais "descontraído" da utilização da linguagem dita obscena e até pela utilização de alguma nudez feminina, elementos que lhe valeram algumas críticas - mas não há nada que não se critique - constitui uma das melhores obras de Allen, e inevitavelmente criou alguma expectativa para o título seguinte. Ou seja este «Celebrity».

O título e as possibilidades do casting perante a temática eram susceptíveis de colocar a salivar alguns dos que têm seguido com fascínio, ou apenas com mera curiosidade, o trabalho do realizador. Leonardo DiCaprio fica muito bem no papel de um actor mimado, histérico e violento, mas Allen provavelmente pensava noutro mais dedicado a destruir quartos de hotéis. Griffith como estrela decadente também é uma escolha curiosa, principalmente depois do seu insuportável papel em «Lolita» (1997). Branagh tem merecido a maioria dos comentários devido a, no fundo, estar a representar o papel habitual de Allen, com os tiques que são sua marca registada, algo que faz relativamente bem, com as hesitações e a gaguez a entrarem no tempo certo. Allen ter-se-á certamente divertido a dirigir Branagh, da mesma forma que gosta de gerir o seu "personagem público", mas não parece que lhe tenha inserido um cariz tão marcadamente "pessoal" como algumas análises sugeriram, chegando-se ao ponto de interpretar o "Help" no céu como um lamento do próprio. Só se for um "Help, quero voltar à forma de antigamente".

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Publicado on-line em 29/3/99.