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X-Men 2/X2
Realizado por Brian Singer
EUA, 2003 Cor – 135 min. Anamórfico.

Com: Patrick Stewart, Hugh Jackman, Ian McKellen, Halle Berry, Famke Janssen, James Marsden, Scott Summers, Rebecca Romijn-Stamos, Brian Cox, Alan Cumming, Bruce Davison, Anna Paquin, Shawn Ashmore, Aaron Stanford, Kelly Hu

poster
Nightcrawler (Cumming), um mutante com o poder de se teletransportar, coloca em risco a vida do Presidente dos Estados Unidos. O Coronel William Stryker (Cox) convence a administração de que a escola do Professor Xavier (Stewart) é uma ameaça e um centro de treino para mutantes perigosos. Wolverine (Jackman) procura as suas origens no Canadá, enquanto Jean Grey (Jenssen) tenta controlar as suas capacidades de telecinesia, que se revelam cada vez mais poderosas. Stryker encontrou um método de usar mutantes para prosseguir os seus fins maquiavélicos.

«X2» estreou em Portugal ao mesmo tempo que começou a ser projectado noutros territórios, como o Reino Unido e os EUA, numa operação comercial que não se destina a acabar com a discriminação de alguns países terem de aguardar seis meses por um filme depois do lançamento norte-americano, mas sim a tentar atenuar os efeitos da pirataria. Com o mesmo intuito inseriu-se uma mensagem no início do filme, via legendagem sobre fundo negro, relembrando a audiência de que é ilegal copiar o filme e solicitando a denuncia de quem capte imagens com uma camcorder, para fazer cópias e distribui-las por pessoas suficientemente idiotas para verem um filme em quaisquer condições, incluindo a tremer, com cabeças à frente ou com comentário áudio do público. (A versão americana provavelmente tem um senhor com voz gravosa a ler o texto projectado.)

«X-Men», o filme original, tem mais méritos do que defeitos e funciona sobretudo pela modéstia e pela simplicidade do desenvolvimento da história, dando espaço a uma mão cheia de personagens e mantendo outros nos bastidores até que chegue a sua hora. O novo filme pega nas mesmas personagens, dá-lhes novos penteados e coloca-as perante novos dilemas, mas o texto já não se afere tão bem definido como o do filme anterior e ao aumento do número de personagens relevantes não se consegue conferir suficiente dimensionalidade. Desse modo, algumas cenas-chave em termos dramáticos não têm mais impacto do que as cenas de acção. Tudo parece demasiado light: o confronto familiar de Iceman, o drama de fé de Nightcrawler, a insegurança de Jean Grey ou a aparente impossibilidade de consumação do amor físico por parte dos dois mais jovens elementos da equipa. Por alguma razão, no primeiro filme, existia algo que nos convencia que pequenas coisas eram de facto importantes para o destino das personagens. Aqui é como se Singer tivesse considerado que está tudo mais que estabelecido e toca a andar que há um terceiro filme em pré-produção.

McKellen
A personagem central, concebida para suscitar mais simpatia por parte do público, Wolverine, arrisca aproximar-se do perfil do herói que se limita a espancar inimigos e a debitar frases engraçadas. A busca pelo passado ficou a pairar no "episódio" anterior e agora resta muito pouco por esclarecer. A sua "origem" já tinha ficado relativamente definida e para que se conferisse impacto dramático, suscitando conflito interno, recorreu-se a um expediente narrativo do qual, convenhamos, já estamos um bocadinho fartos, com a necessidade de concentrar personagens e acontecimentos. [Se já viu o filme seleccione o espaço branco que se segue para ler o resto do parágrafo, referente a uma "surpresa" do argumento. Possíveis spoilers também para «Batman» e «Daredevil»]
Em «Batman», os argumentistas consideraram que era dramaticamente válido ligar o Joker, nemésis do herói no primeiro filme, à sua origem. Em «Daredevil», uma vez mais, se considerou que se tinha de apresentar um universo fechado, circular, e o Kingpin está também ligado à criação do herói. Em ambos os casos, o argumentista recorre a uma muleta narrativa que reforça o "direito" último de vingança ao herói, ainda que normalmente se evite a vingança cega (mesmo que o protagonista vá matando brutalmente alguns inimigos ao longo do filme, o final convém ter alguma moralidade, senão aonde é que íamos parar?) Na altura em que se produz «X-Men 2», já dispensávamos novamente a coincidência do vilão da peça estar ligado à criação do protagonista principal. Não se trata agora de alguém que matou um ente querido, ou algo do género, antes alguém que o criou, ficando a dúvida se houve ou não consentimento. Em todo o caso, tal mecanismo desvaloriza consideravelmente um texto que funcionaria melhor se fluísse casualmente como o filme original e não se sentisse a necessidade artificial de encerrar o círculo dentro do mesmo filme.

Romijn-Stamos
Os inimigos, ou melhor as inimigas, que Wolverine tem de enfrentar davam azo a outras possibilidades. Yuriko Oyama ou Lady Deathstrike é uma personagem com algum carisma, decorrente da presença física da actriz Kelly Hu e do facto de não proferir palavra (sugere uma aura de mistério), mas acaba por ser subaproveitada a dois níveis: ao nível do texto, sabemos que é manipulada por Stryker, mas vem a ser tratada pelo filme como uma vilã regular, pela qual não temos o direito de sentir o que quer que seja; ao nível da acção, perdeu-se o requinte do filme anterior, onde Yuen Kwai coreografou os combates corpo a corpo e assumiu funções de director de segunda unidade. A acção agora é algo fastidiosa. Pow pow bang bang. Fim. Compare-se o confronto físico, mas também o jogo do gato e do rato (ou do camaleão e do lobo) em «X1», com o duelo com Lady Deathstrike neste segundo tomo.

A segunda inimiga de Wolverine, Mystique introduz um elemento semi-erótico do qual seria interessante ver algum desenvolvimento, ainda que não seja de prever a sua exploração, pois os produtores terão interesse em manter a classificação etária adequada a crianças e adolescentes. O erotismo a que me refiro não se prende com o efeito "uau, ela parece que está nua, só que, hmm, azul e com... umas coisas coladas em algumas partes do corpo", mas a outro ingrediente narrativo que o leitor identificará se viu o filme. Infelizmente, mantém-se o tom light e descomprometido e fica-se por uma singela piada.

Hu
Por fim, Magneto parece tornar-se mais oportunista e psicótico do que preocupado com a preservação da "espécie". Ainda que se aprecie um final que procura suster o interesse para a sequela — e quem conhecer minimamente a banda desenhada entenderá melhor a imagem final —, há que referir que o clímax se perde por querer ser demasiado grandioso. Os efeitos especiais são relativamente convincentes durante o filme, mas são artificiais quando procuram ilustrar os poderes de Jean Grey nos momentos finais. Fica-nos também a sensação de que está tudo demasiado construído para ter de ser ela e não outro mutante qualquer a fazer alguma coisa. No meio de tantos poderes, não haveriam outras opções? Teletransporte, temporal, estrada de gelo...? O suspense do final, com as dores de cabeça prolongadas (mais que uma vez...), quase roça o risível.

Aguardamos para ver se «X3» («XXX» já tem copyright? Talvez «X ao Cubo»?) envereda por desenvolvimentos mais intimistas, usa os poderes dos super-heróis de modo mais imaginativo ou se opta novamente por uma ameaça que põe todo o mundo em risco (e provoca a ruptura dos stocks de aspirina).

**1/2
classificações


Publicado on-line em 28/5/03.