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Heist – O Golpe/Heist
Realizado por David Mamet
EUA/Canadá, 2001 Cor – 109 min..

Com: Hackman, Danny DeVito, Delroy Lindo, Sam Rockwell, Rebecca Pidgeon, Ricky Jay, Alan Bilzerian, Richard L. Friedman, Robert Lussier, Mark Camacho

Uma equipa de ladrões de elite completa um golpe bem sucedido, mas o líder, Joe Moore (Hackman), vê o seu futuro profissional comprometido ao não conseguir evitar que o seu rosto se torne conhecido. Bergman (DeVito), o gangster que contratou o serviço, não aceita a retirada de cena de Moore, recusando-lhe o pagamento do golpe anterior, caso ele e a respectiva equipa não levem a cabo um outro assalto, em cuja preparação já se gastou muito dinheiro. Contra a vontade de Moore, Bergman insiste também na participação de um dos seus homens, Silk (Rockwell), interessado na acção, mas também na mulher de Moore, Fran (Pidgeon).

David Mamet é um conceituado autor de peças de teatro e de livros – ganhou o Pulitzer por “Glengarry Glen Ross”, de 1984, feita filme em 1993, por James Foley – e assinou o argumento de variadas obras realizadas por outros cineastas, como «O Veredicto» (1982), «Os Intocáveis» (1987) ou «No Limite/The Edge» (1997). Os filmes por si realizados abrangem géneros diversos, mas costumam ter em comum uma narrativa complexa, cuidadosamente construída e polvilhada de pormenores. A sua obra falará por si, mas o nome de Mamet é associado sobretudo aos filmes que pegam em grandes burlas e golpes clinicamente preparados, como «Jogo Fatal/House of Games» (1987) e «O Prisioneiro Espanhol» (1998).

Depois de um «State and Main», mais humano e algo autobiográfico, que demonstrou o talento do autor para a escrita de comédia, «Heist» trás David Mamet de volta aos planos intrincados e aos heróis fora-da-lei de recursos e imaginação inesgotável. Desta vez não temos burlões a tentar enganar um protagonista ingénuo, antes seguimos um grupo de assaltantes dedicados a golpes quase impossíveis. Uma espécie de equipa “Missão: Impossível” dedicada a amealhar grandes quantidades de dinheiro de forma ilícita.

Em «Heist» temos duas peças muito bem delineadas e filmadas por Mamet: o golpe que dará o título ao filme e aquele que vemos na sua abertura. Independentemente da exequibilidade dos golpes no mundo real, o pormenor na sua preparação é deveras convincente, ao contrário do que sucede em muitos thrillers de espionagem “high tech”, como os referenciados «Missão: Impossível» (sobretudo o primeiro), onde as preocupações com a lógica são quase inexistentes. Temos também um Gene Hackman em forma, um Danny DeVito num curioso papel de gangster impiedoso, mas que transmite alguma simpatia e a sra. Mamet, Rebecca Pidgeon, num papel (convenientemente) sexy, muito distante dos trajes aprumadinhos em que a temos visto noutros filmes dirigidos pelo marido.

Mamet, no entanto, vai um pouco longe demais. Tentando superar a estrutura mais habitual, em que se sugere algo ao público, mas depois mostra-se que era um truque, em «Heist», Mamet recorre a um duplo engodo: convence o público de que há um truque com resolução mais ou menos previsível, e depois vai mais longe do que o esperado, mostrando outro truque por detrás do primeiro. Isto é, engana-nos com o engano. Tal é divertido um par de vezes, mas depois torna-se cansativo. Aí já não queremos saber o que realmente aconteceu ou vai acontecer, só esperamos que se despachem a mostrá-lo. Isto, adicionado a um par de situações que testam a nossa “suspensão da descrença”, é o que poderemos rotular de Síndrome «The Game» – i.e., não definir limites e não respeitar as regras do universo criado.

Um dos elementos difícil de engolir do plano prende-se com a utilização de um camião, de uma forma que no mundo real dificilmente seria um método equacionado para produzir os efeitos desejados. O mesmo poderia ser dito do sistema de distrair as atenções da polícia e dos transeuntes por parte da personagem de Ricky Jay (osso partidos do ofício?), mas, como é apresentado logo no início, temos tendência a rir e a esquecer. Além disto, na parte final do filme, a importância do papel de Fran acentua-se, mas as manipulações de Mamet conferem-lhe uma sensação de estarmos perante comportamentos aleatórios, em que já não sabemos o que é que as personagens querem – para lá do que querem fazer parecer –, ao mesmo tempo que a relação do casal parece irrelevante para a trama, em contradição com o que se constrói na primeira parte do filme.

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Publicado on-line em 3/02/02.