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Massacre no Texas/ The Texas Chain Saw Massacre
Realizado por Tobe Hooper
EUA, 1974 Cor - 83 min

Com: Marilyn Burns, Allen Danziger, Paul A. Partain, William Vail, Teri McMinn, Edwin Neal, Jim Siedow, Gunnar Hansen, John Dugan, Robert Courtin

Na sequência de notícias sobre profanações em cemitérios no interior texano, Sally Hardesty (Burns) e o irmão deficiente, Franklin (Partain), viajam até ao local onde o avô está sepultado. Acompanham-nos três amigos: Jerry (Danzinger), Kirk (Vail) e Pam (McMinn). No caminho de regresso, decidem dar boleia a um indivíduo que se revelará muito estranho e, posteriormente, ameaçador (Neal), mas o verdadeiro martírio surgirá quando os jovens encontrarem a casa onde reside uma família de homicidas canibais, que os perseguirá um a um.

Em 1974, parecia ser legítimo fazer filmes destinados a provocar alguma reacção no público. Neste caso, desconforto, medo, vontade de estar em toda a parte menos ali, em frente ao écran. Em 1999, fazem-se filmes formatados para a "felicidade plena" da audiência. Algo que "nos" faça sentir que gastamos 800 escudos muito bem gastos. Hoje, o público mais jovem rir-se-á de muitas cenas do «Massacre no Texas», por um lado, satisfeitos por não estarem a ser afectados (a sério?), por outro, porque está muito "mal feito".

O filme é um marco histórico (também) na histeria censora que tem assolado muitos países supostamente democráticos e civilizados. Foi proibido no Reino Unido, França e Alemanha, por exemplo. (É um mito pensar que os EUA são um dos territórios onde é mais difícil assistir a obras cinematográficas "audazes" sem cortes da censura). Em Dezembro do ano passado, «The Texas Chain Saw Massacre» foi relançado em algumas salas Britânicas, mas sempre sem a autorização oficial do organismo de classificação (e censura), o BBFC. Os "Councils", autarquias locais, têm a última palavra no que diz respeito à possibilidade de exibição de um filme sem certificado; o mesmo não funciona no mercado vídeo, onde a palavra do BBFC é lei. Foi já este ano que aquele organismo considerou que o "grande público" poderia assistir ao filme de Tobe Hooper, concedendo-lhe finalmente um certificado de exibição (e sem cortes; mas cortes onde?) com "justificações" como a pobreza dos meios empregues, que tornam o filme muito pouco convincente (o mesmo que os adolescentes, alguns sem sequer a idade legal para assistir ao filme, comentam), mas também porque "tanto quanto este Gabinete tem conhecimento, nenhum mal terá surgido como consequência do visionamento deste filme". 1999.

Para mais tarde cozinhar
O relançamento deste filme, que será um dos maiores clássicos do cinema de horror dito "moderno", ao lado de «A Noite dos Mortos Vivos» (1968), de George A. Romero ou «O Exorcista» (1973), de William Friedkin, recebeu em Portugal o subtítulo promocional de "director's cut", o que não será totalmente incorrecto - mas existem muitos filmes onde tal epíteto não é "totalmente incorrecto", e que não o receberam só por isso - já que a montagem final é aquela que Hooper quis que nós víssemos. O que podemos ver agora nas salas é também a mesma montagem pela qual o filme sempre foi conhecido. Têm existido versões com cortes em alguns países Europeus, mas o filme existe hoje na mesma forma que foi exibido em 1974. O que podemos ver hoje é uma cópia nova, com uma qualidade bastante razoável, em termos de imagem e de som (originalmente em mono, a remasterização mantém o único canal gravado, mas com maior fidelidade que contribui em muito para o impacto de diversas cenas), que estimula os nossos sentidos como uma cópia velha e escura, digamos Holandesa, nunca o poderia fazer. Como se diz, não é totalmente incorrecto que se apelide este lançamento de "director's cut", mas tem de se lamentar quando se acrescentam comentários nas notas de imprensa ou na revista Estreia (ligada à distribuidora) dizendo que se trata de uma versão "restaurada e aumentada pelo próprio realizador". O termo poderia ter alguma utilidade se aplicado num país onde existisse um regime instituído de censura (mas nem no Reino Unido o filme assim foi lançado), não em Portugal onde presumimos que todos os lançamentos estão livres de cortes impostos pelo distribuidor ou pelo gabinete responsável (que por cá não existe, não tem que existir, como é óbvio, e onde, acrescente-se, a censura é algo não só considerado ignóbil como também formalmente inconstitucional). A mesma revista, e as notas em catálogos do Fantasporto, cujo logotipo apresenta a projecção, sempre - e de forma lamentável e desinformativa - destacaram a componente da violência "gore" do filme (característica que não existe, não é e nem nunca será representativa desta obra-prima).

O filme de Hooper mantém uma grande intensidade, 25 anos depois (excepcionando-se, claro, os efeitos em grupos de adolescentes curiosos). Não faz sentido querer sugerir que se mantém o mesmo impacto de 74, mas a seriedade com que o horror é tratado já não se encontra nos filmes produzidos actualmente. A montagem e o som servem sobretudo para destacar o sofrimento dos personagens e para que o espectador melhor o partilhe. Os grandes planos do rosto e dos olhos de Marilyn Burns já fizeram história, e a sua histeria, durante quase metade do filme, será um dos elementos que mais contribuem para o mal estar da assistência. Hoje, é mais "natural" que o/a jovem vítima se lembre de alguma gracinha para dizer, algo que decorre da preocupação principal dos estúdios pelo nosso conforto (o que num filme de horror devia ser o mais ridículo dos conceitos, mas, sabe-se lá porquê - hu, receitas de bilheteira? - não é).

Capa vídeo da nova edição
Hooper soube escolher o material para o seu "shocker". A inspiração viria do psicopata Ed Gein que, em meados dos anos 50, matou algumas pessoas e desenterrou cadáveres que utilizou na construção de peças de mobiliário e de máscaras que utilizaria (de ambos os sexos). Gein inspiraria outras obras, incluindo «Psycho» que Hitchcock viria a filmar em 1960, ou o menos conhecido «Deranged» (1974), e, provavelmente, «Silence of the Lambs» (1991). Cliché ou não - mas não é a realidade que os delineia? -, ele gostava muito da mãe e queria ficar com ela para sempre… Das sequelas de «TCM» apenas interessa ver o segundo tomo - «The Texas Chainsaw Massacre 2» -, que opta por levar ao extremo o humor negro e que contém uma representação de Dennis Hopper digna de registo. O terceiro filme é mau; o quarto é ainda pior. O anúncio da quinta "parte" e da "homenagem" dos 25 anos não nos provoca propriamente ataques de ansiedade.

A projecção de «Massacre no Texas» na cópia nova, remasterizada, é uma oportunidade única para apreciar este grande clássico do horror. Escolha preferencialmente uma sessão onde se preveja que não exista grande afluxo de adolescentes irritantes.

*****
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Publicado on-line em 5/6/99.