cartaz
comentários
coluna
secção informativa
favoritos
arquivo

index

Os Crimes dos Rios de Púrpura/Les Rivières Poupres
Realizado por Mathieu Kassovitz
França, 2000 Cor – 106 min. Anamórfico.

Com: Jean Réno, Vicent Cassel, Nadia Farès, Jean-Pierre Cassel, Karim Belkhadra, Didier Flamand, François Levantal, Francine Bergé, Dominique Sanda

Nas proximidades de uma universidade isolada nos Alpes franceses, um cadáver é descoberto. A posição em que é encontrado e o modo como o corpo foi mutilado e preparado, leva a que a policia entre em contacto com um investigador especial, Pierre Niémans (Réno), chamado aparentemente sempre que surgem estranhos casos de homicidas inspirados por «Se7en» ou «Silence of the Lambs». Uma investigação paralela, por outro polícia, Max Kerkerian (Vicent Cassel) vai contribuir para a recolha das peças do puzzle.

Exibido e ante-estreado no Fórum Lisboa, no âmbito da 2ª Festa do Cinema Francês, o último filme de Mathieu Kassovitz («O Ódio», «Assassino(s)»), tem sido muito falado, tanto pelo grande sucesso comercial no país de origem, como pela temática – o filme de assassinos em série e suas variantes pós-modernas – que não é das mais frequentes no cinema francês. Mas se Kassovitz e a produção partiram para um objectivo de criar um thriller tipicamente francês, por alguma razão, o resultado final é mais característico do cinema americano mais derivativo.

Com Jean Reno, o mais popular e exportável actor francófono do momento, «Les Rivières Pourpres» introduz-se, como não podia deixar de ser, com a descoberta de um cadáver, a que se seguirão outros, mortos de maneiras mais ou menos imaginativas. Muito se disse sobre a construção de cadáveres realistas para cenas de autópsia – os créditos iniciais desenrolam-se sobre um corpo –, mas o potencial elemento para a criação de uma atmosfera negra e inquietante é subaproveitado.

As vítimas parecem estar ligadas à universidade. Desde o início do filme que se sugere um determinado cenário sobre o qual os acontecimentos se desenrolam e que os poderia vir a justificar. Este cenário afere-se interessante e sugere uma intricada trama de filme negro, que nos poderia remeter para outros clássicos que marcam a consciência colectiva apesar do decurso de algumas décadas. Seria complicado enumerar ou explicar o porquê, sem contar os pormenores (mas duvido que alguém não seja completamente informado por qualquer crítica dos jornais da nossa praça e que parta para o filme com poucas surpresas por desvendar). Mas muito se promete e pouco se cumpre.

Kassovitz demonstra segurança na realização, apesar de alguns formalismos gratuitos (sabemos que ele aprecia o efeito dolly in-zoom out desde «La Haine», mas aqui usa um par deles e o primeiro parece mais um teste de câmaras do que outra coisa qualquer), mas o problema essencial do filme é narrativo, não formal. É difícil escolher em que categoria inserir a sequência despropositada com um combate de artes marciais, que tenta ser “desculpado” com o jogo de computador que decorria nesse cenário – um piscar de olhos pouco interessante ou engraçado a «Assassino(s)». Não há diferença na actuação dos oponentes, denotando apenas a presença do terceiro que coordenou a acção. Quando começa o combate, é como que saíssemos da realidade do filme.

Com um tempo de aproximadamente 1 hora e 40 minutos, «Les Rivières Pourpres» fornece-nos pistas e descreve um cenário curioso, durante boa parte dessa duração. Os elementos-base da história acima referidos são deveras sugestivos, mas a acção do filme desenrola-se quase sempre fora desse "círculo". O terceiro acto, ao contrário do que seria de esperar, não constitui uma entrada no perímetro, permanecendo-se sempre à distância do (que deveria ser o) essencial. O que poderia ser apresentado perante os nossos olhos é descrito à distância, durante um clímax que já não nos consegue interessar sobre quem morre ou deixa de morrer ou sobre quem é que fez o quê.

A conclusão, e os momentos que a precedem, poderiam ser retirados de qualquer banal thriller de Hollywood, com os seus clichés e surpresas forçadas. Há como que uma colisão entre um filme que se queria fazer e outro que se despachou na montagem. Actualmente muitos filmes têm tempo a mais, podendo beneficiar de uma excisão de uns 30 ou 40 minutos. Aqui sucede o contrário: removendo uns 20 minutos do final, poder-se-ia ter desenvolvido o filme noutra direcção, com uma hora ou mais extra. Poderíamos ter tido um bom filme. Ou, pelo menos, melhor.

**
classificações

Publicado on-line em 22/10/01.