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O Enigma do Horizonte/Event Horizon
Realizado por Paul Anderson
EUA/Reino Unido, 1997 Cor - 96 min. Anamórfico
Com: Laurence Fishburne, Sam Neill, Kathleen Quinlan, Joely Richardson, Richard T. Jones, Jack Noseworthy, Jason Isaacs, Sean Pertwee, Peter Marinker, Holley Chant

2047, a nave Lewis and Clark parte da Terra para Neptuno seguindo um sinal da Event Horizon, uma nave desaparecida 7 anos atrás e concebida para tentar viajar mais rápido do que a luz. A tripulação é comandada pelo Capitão Miller (Fishburne), mas é o Dr. Weir (Neill) que explica a importância da missão.

«Event Horizon» mistura o terror com a ficção científica, um sub-género que produziu alguns filmes bem sucedidos, sendo o melhor exemplo «Alien» (1979), de Riddley Scott. Mas outras referências foram despejadas no misturador, incluindo «Hellraiser» (1987), de Clive Barker, do qual o filme de Paul Anderson poderia perfeitamente passar por remake, já que usa uma estrutura muito semelhante. No filme de Barker um quebra-cabeças com a combinação correcta abre portas para mundos de "pesadelo e prazer". Tal é a premissa camuflada deste filme. Obviamente o prazer não tem muito destaque em filmes de horror (excepto talvez o prazer na dor), por isso, naturalmente, as portas que se abrem são sempre para câmaras de tortura habilmente manufacturadas. Se durante os 20 minutos iniciais as semelhanças não seriam muito notórias, assim que se começa a falar de "Inferno" só resta esperar que o personagem "possuído" diga que tem "tantas maravilhas para mostrar". Não decalcando a frase – porque não?, pelo menos teria alguma graça – não se pode dizer que se caminhe num sentido radicalmente oposto. Aliás, alguns mecanismos da nave parecem partilhar o designer com o puzzle daquele filme.

Enquanto desenvolve o tema, «Event Horizon» sugere que possa vir a ter algumas características redentoras. A utilização do cenário de ficção científica para entregar um filme de horror poderia trazer resultados estimulantes, caso houvesse a mínima fagulha de imaginação que ateasse o lamaçal de ideias em segunda mão esparramadas no guião de Philip Eisner (bom, a lama nunca foi um bom combustível). Quando se finaliza a "explicação" da premissa e se entra no modo "filme de terror standartizado", perguntamo-nos para quê tanto trabalho. Para mais um filme de terror sofrível e déjà vú, não valia a pena arrastar tanto o espectador. Na verdade, e dado o cenário, temos de complementar a referência a «Hellraiser»: «Event Horizon» lembra mais o filme de "Alan Smithee" (Kevin "eu não deixo o meu nome nisso" Yagher), «Hellraiser: Bloodline». Este par de filmes poderá ser o exemplo máximo de um sub-sub-género que poderia ser apelidado de "shit floats in space".

Talvez a culpa não seja toda dos cineastas e do argumentista. Facilmente se pode imaginar que algum executivo apareça a perguntar coisas como "onde é que se insere a obrigatória cena da explosão-seguida-de-fogo-a-perseguir-o-herói que o público tanto gosta?" (Quem consegue correr mais rápido que uma explosão merece triunfar.) Possivelmente foi assim que se teve de conceber um sistema tão funcional e tecnologicamente avançado como o método de separação entre os dois módulos da nave. Não poderiam usar um encaixe qualquer, velcro, etc., accionado por um botão? Não, porque tinha de haver uma explosão. E o disparate surpreendente que é um tiro contra um vidro, só porque a história tem que avançar e se necessita de mais um momento "emocionante", também tem muito que se lhe diga. De resto, os personagens são delineados de modo tão simplista que até assusta (mais do que o eventual horror). Duas ou três pinceladas em relação à situação deixada na Terra pelos diversos elementos da equipe, para se materializar na respectiva assombração e o cada vez mais irritante Erro do Passado que o personagem lamenta de tal forma que nos coloca de imediato a pedir o fim do filme e a resolução do problema, a paz interior, etc. e tal. Será que o polícia com as mãos tremelicantes de «Die Hard» (ou o pistoleiro alcoólico de milhentos westerns) tem que despontar em todos os produtos hollywoodescos? E será obrigatório que se apresente sempre uma justificação para o prazer em ir ao cinema com esta fórmula? Será que o público acredita na conversa de que todos os filmes são sobre "pessoas normais em situações extraordinárias" e sai da sala não a pensar que viu um bom filme de [preencher género], mas com um sorriso idiota porque o personagem conseguiu matar de novo (sim, sim!) ou salvou alguém, compensando pela falha do passado mostrada sempre em bonitos flashbacks?

Lamenta-se mais porque este filme mau não dará grande dinheiro à distribuidora (supõe-se que será mais um item num pacote do que um filme escolhido para exibir), e teve as honras de estreia comercial que dezenas de filmes interessantes, que teriam o mesmo comportamento miserável a nível de receitas, não mereceram.

(No Warner-Lusomundo Colombo, o filme foi precedido de um trailer do sistema digital DTS, mas a projecção foi provavelmente analógica. Uma reprodução em DTS não admite quebras de som na mudança de bobine já que o som é lido a partir de um CD-Rom. Mas como o trailer até era bonito…)

*1/2
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