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Boa Viagem/Bon Voyage
Realizado por Jean-Paul Rappeneau
França, 2003 cor - 114 min. Anamórfico.

Com: Isabelle Adjani, Gérard Depardieu, Virginie Ledoyen, Yvan Attal, Grégori Dérangère, Peter Coyote, Jean-Marc Stehlé, Aurore Clément, Xavier De Guillebon, Edith Scob

poster
Paris, 1939. Viviane D'Anvers (Adjani) é uma popular actriz francesa, que não hesita em usar os homens poderosos que se arrastam a seus pés. Depois de se meter num sarilho, com um cadáver na sala de estar, Viviane telefona a Frédéric (Dérangère), um jovem aspirante a escritor, amigo de infância e ex-amante. Frédéric acaba por se envolver demasiado e vai parar à prisão. No meio da confusão gerada pela invasão do país pelo exército alemão, os dois voltarão a encontrar-se em Bordéus, onde o governo francês tenta lidar com a situação. Para se proteger, Viviane mantém uma relação com o ministro Beaufort. Entretanto, Frédéric tenta ajudar Camille (Ledoyen) e o professor Kopolski (Stehlé), a transportar segredos científicos para fora do país, antes que caiam nas mãos dos alemães.

«Boa Viagem» foi o filme escolhido para inaugurar a Festa do Cinema Francês deste ano, que se realizou no Cinema São Jorge, em Lisboa, com a presença da actriz Isabelle Adjani [reportagem fotográfica aqui »], tendo também sido seleccionado para representar a França nos Oscars da Academia de 2004.

Ledoyen Dérangère
Virginie Ledoyen e Grégori Dérangère.
Jean-Paul Rappeneau é um realizador veterano, mas pouco prolífero, havendo assinado apenas sete longas-metragens desde 1965, de entre as quais a mais célebre será «Cyrano de Bergerac», protagonizada por Gérard Depardieu. O realizador trabalhou com Adjani, em 1982, em «Tout Feu, Tout Flamme». Por sua vez, as estrelas de cartaz estiveram anteriormente juntos em «Barocco» (1976), de André Techiné, e «Camille Claudel» (1988), de Bruno Nuytten, constituindo este último a referência mais relevante, nem que seja pela possibilidade de comparar as relações de poder entre as respectivas personagens; em ambas as obras, a personagem de Depardieu detém o poder, de uma forma ou de outra – no filme de Nuytten interpreta o escultor Auguste Rodin – mas, em «Boa Viagem», apesar de interpretar um ministro, é a personagem de Adjani quem o domina (em «Camille Claudel», luta para sair da sombra de Rodin),

Rappeneau cria uma obra que pretende recuperar o espírito dos filmes de aventuras clássicos, de tempos idos, com uma narrativa despretensiosa, assente sobre factos históricos, que deixaram uma marca profunda nos franceses, nomeadamente a ocupação nazi e a divisão entre colaboracionistas e resistentes. Havendo tempo para expor essa bipolarização, tanto ao nível do cidadão comum, como ao nível das instâncias políticas, o filme mantém, habilmente, o foco nas ligações românticas entre as quatro personagens principais, com aproximações e afastamentos comandados por uma série de peripécias humorísticas.

Depardieu Adjani
Depardieu e Adjani.
Sendo certo que os nomes sonantes na ficha técnica são Adjani e Depardieu, as figuras centrais à trama são as personagens de Frédéric e Camille. A invenção que Camille quer proteger, a todo o custo, não passa de um McGuffin para juntar os dois jovens na mesma rota. Ela precisa dele, porque ele conhece Viviane, que, por sua vez, é amante do ministro que pode ser decisivo para a fuga do professor Kopolski para Inglaterra. É natural que o protagonista seja posto à prova e, por várias vezes, tenha de decidir entre a interesseira Vivianne e a pura e virtuosa Camille (uma decisão muito difícil...). Um par de papéis secundários torna o texto um pouco mais complexo, com Raoul (Attal) a disputar as atenções de Camille e Peter Coyote, na pele de Winckler – mais um homem que ela não hesitará em usar para satisfazer os seus interesses, mas que revela, também, interesses próprios.

Torna-se claro – sobretudo no final – que Camille representa os resistentes e Vivianne os colaboracionistas e Frédéric o povo francês apanhado no meio. De um lado, a beleza produzida, o dinheiro, o poder, o glamour; do outro, sentimentos simples e puros, como o amor (e o patriotismo). Mas, como se disse, independentemente do fundo histórico-político, «Bon Voyage» sustém-se como uma comédia de aventuras, ligeira q.b., concebida como obra de entretenimento, onde ainda se pode destacar a fotografia de Thierry Arbogast, várias vezes premiado pelo seu trabalho («O Quinto Elemento», de Besson, e «Le Hussard sur le Toit», de Rappeneau, nos Césares, e «She's so Lovely», de Sean Penn, em Cannes).

Adjani
É, no mínimo, agradável que vamos tendo também acesso ao cinema francês fora do mais usual circuito de “arte e ensaio”, para que se diluam cada vez mais os rótulos atribuídos automaticamente a filmes só com base no seu país de origem. A edição de 2003 da Festa do Cinema Francês providenciou um índice apetitoso daquilo que poderemos ver nos próximos meses.

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Publicado on-line em 26/10/03.