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Para Além do Horizonte/What Dreams May Come
Realizado por Vincent Ward
EUA, 1998 Cor - 113 min. Anamórfico
Com: Robin Williams, Cuba Gooding Jr., Annabella Sciorra, Max Von Sydow, Jessica Brooks Grant, Josh Paddock, Rosalind Chao, Lucinda Jenney, Maggie McCarthy, Wilma Bonet

Chris (Williams) e a mulher Annie (Sciorra) têm que lidar com os mais profundos dramas familiares. Uma desgraça nunca vêm só, num filme em que o ponto de partida não é o que vai suceder aos personagens, mas como resolverão os seus problemas depois do pior que lhes podia suceder ter sucedido. Pode não fazer sentido, mas trata-se de um passeio pelo Além. Williams é ajudado por alguns guias celestiais, que lhe dão as indicações necessárias para ir ao Inferno e voltar.

O mais recente filme de Vicent Ward passa-se, na sua quase totalidade, no mundo dos mortos, em cenários irreais, levados à tela por efeitos especiais que não são meras execuções técnicas, mas verdadeira "arte". Os cenários são de uma beleza quase sublime, à medida que Robin Williams vai saltando pelos mundos de sonho de diversas pessoas que conheceu em vida. O seu próprio "mundo" é baseado nas pinturas da esposa, levando-se ao extremo o conceito de "sentir a arte" (mais propriamente atolar-se nela até aos joelhos).

«What Dreams May Come» é, sem sombras de dúvida, um filme visualmente belo, com imagens que permanecem na retina do espectador, o qual preferirá percorrer os diversos quadros com o olhar a seguir a história dramática do romance post mortem, e da aceitação da natureza das coisas (mortas) por parte do personagem central. A irrealidade latente é necessariamente inversamente proporcional ao nosso interesse pelo destino dos personagens, e requerer-se-ia algo mais para nos agarrar a uma história em que o ponto de partida é a morte. Normalmente, preocupamo-nos com a morte de alguém no decurso ou no final do filme. Uma boa tragédia pincela morosamente os personagens e depois traz-lhes todas as desgraças possíveis, maxime a morte, mas a tortura física prolongada também não costuma ficar mal. Aqui, como é óbvio, não há esse receio. Williams e Sciorra surgem a sofrer desalmadamente, e quando o cenário muda o sofrimento prossegue, infindável, não se misturando as imagens bonitas com os cenários mais terrenos ou negros onde o drama tem a sua génese. Pelo meio existem uma série de pequenos gracejos que - além de não terem piada e de estarem fora do registo normal do filme - em nada ajudam à definição dos personagens.

Não se fornece uma base lógica sobre a mecânica do pós-vida, para além de que o "espaço" é infindável, e todos têm direito ao seu pedaço de Céu. É menos difícil de visualizar que, não existindo Tempo, Chris tenha, em dado momento, três minutos para permanecer em certo local. A sequência da sua viagem resume-se a encontrar personagens que escolhem a identidade de outra pessoa que ele conheceu em vida, para depois, muito naturalmente, serem reveladas como outras pessoas (com rostos mais familiares). O inferno é algo decepcionante, depois dos "céus" tão trabalhados a nível plástico, apesar de uma imagem curiosa - uma planície de cabeças -, mas cujo efeito final raia o involuntariamente(?) cómico. Uma informação importante sobre o reino de Satanás: os "internos" não reconhecem as visitas, mas se falarem emotivamente na terceira pessoa, pode ser que algum milagre suceda e que o Amor vença.

O drama está demasiado longe da Terra para funcionar. O filme é belo, tão belo que chega a ser enjoativo. Eduardo Serra é um excelente director de fotografia em formato "scope", (de que é sintomática a nomeação para o Oscar por «Wings of the Dove» (1997)), mas este não é o género de filmes onde o seu talento melhor será usado, já que o tratamento digital da imagem domina os cenários e secundariza a iluminação natural de cena. A imagens são bonitas, mas a sua inserção na narrativa não aquece nem arrefece (e pelo menos o Inferno poderia aquecer um pouco). Robin Williams é lamentavelmente muito limitado no campo da interpretação dramática.

Para uma história de amor para lá da vida e da morte mais consistente, mais vale alugar o terceiro tomo da série «O Regresso dos Mortos Vivos», escondido por detrás do medonho título «Experiência Maldita».

**
classificações

(Curiosamente ecoa-nos na cabeça uma canção do único álbum de uma banda chamada The Happy Family:

"Let's work our passage to hell
A landscape of wide open spaces
That's where a salesman lives well
And his wife always knows what her place is

Let's work our passage to hell
A landscape of wide open spaces
That's where a salesman lives well
And his wife always recognises old familiar faces
")