cartaz
comentários
coluna
secção informativa
favoritos
arquivo

index

A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça/Sleepy Hollow
Realizado por Tim Burton
EUA, 1999 Cor - 105 min.

Com: Johnny Depp, Christina Ricci, Miranda Richardson, Michael Gambon, Casper Van Dien, Jeffrey Jones, Richard Griffiths, Ian McDiarmid, Michael Gough, Christopher Walken, Marc Pickering, Lisa Marie

1799, o inspector da polícia novaiorquina, Ichabod Crane (Depp), é enviado para o povoado de Sleepy Hollow, para investigar crimes de decapitações em série. A povoação vive em pânico, na expectativa de mais uma morte, enquanto Crane procura usar métodos científicos contrariando as crenças locais de que se tratam de actos perpetrados pelo espírito vingativo de um guerreiro sanguinário, decapitado décadas atrás. Ficando a residir na casa do homem mais poderoso das redondezas, Baltus Van Tassel (Gambom), que vive com a mulher (Richardson) e com a filha, Katrina (Ricci), o investigador começa a delinear uma complexa teoria conspirativa, até que vê com os seus próprios olhos o criminoso em acção.

«Sleepy Hollow» parte do clássico conto de Washington Irving, "The Legend of Sleepy Hollow" (onde o distribuidor terá ido buscar inspiração para parte do título nacional mais explicativo), reinterpretado por Kevin Yagher e Andrew Kevin Walker, com guião deste último. Yagher é mais conhecido como homem de efeitos especiais de maquilhagem (aqui também contribui na concepção de efeitos visuais), tendo trabalhado nas série «Pesadelo em Elm Street» e «Child's Play», sendo inclusive o autor do boneco "Chucky", em «Coccon» (1985) ou no mais recente «Face/Off» (1997), entre outros. A sua estreia na realização - «Hellraiser: Bloodline» (1996) - foi infeliz, devido a conflitos com o estúdio sobre a montagem final, levando-o a retirar o nome dos créditos. Walker, por seu lado, é basicamente "o tipo que escreveu «Se7en»" e há-de continuar a assim ser conhecido enquanto não finalizar o guião de um filme igualmente marcante.

O anteriormente escrito serve sobretudo para introduzir a questão da separação entre o argumento e a componente visual de «Sleepy Hollow», uma vez que Tim Burton é frequentemente referido como um visionário: em filmes como os dois primeiros tomos da série «Batman» (1989, 1992), «Eduardo Mãos-de-Tesoura» (1990) ou «Ed Wood» (1994), reconhecemos um cunho marcadamente pessoal, visual, mas também temático. «Sleepy Hollow» é bonito de se ver, sem dúvida. A fotografia é irrepreensível e os efeitos digitais são usados eficazmente na construção de belos cenários, e na concretização de cenas de violência que contrariam a tendência de virar a cara para o lado no momento do golpe fatal, surgindo perante nós em diversos planos contínuos, onde vemos a vitima antecipando o momento da morte, segundos antes da cabeça voar, cortada por uma afiadíssima lâmina. Os efeitos são tão convincentes como um par de cenas nos filmes de zombies de George Romero, mas o impacto não é tão grande dada a diferença de orçamentos, os 20 anos que distam e os limites dos efeitos de maquilhagem ou de animatrónica, perante a flexibilidade dos actuais efeitos digitais, cuja única limitação se prende com mais ou menos milhões de dólares à disposição.

Há no filme de Burton uma separação "mente/corpo". Enquanto a imagem é 5 estrelas, o argumento está limitado por convenções de género. Não só do género "horror", mas sobretudo do "policial", porque cedo «Sleepy Hollow» se transforma num "whodunit", com a particularidade de conter elementos sobrenaturais. O argumento é exageradamente complexo, adicionando variadas motivações criminais, que apontam o dedo a uma série de suspeitos. Cria-se inclusive uma teoria da conspiração e depois procura-se, já próximo do final e à pressa, colocar na boca do vilão um infindável e pormenorizado discurso explicativo, que tenta amarrar em tempo recorde todas as pontas por atar, bem como pistas fornecidas ao longo do filme e que requerem agora explicação. Burton não está presente como "autor", mas como mero gestor dos tempos do filme.

A história torna-se pouco interessante, à medida que as explicações se aproximam, sendo os principais sacrificados os personagens. A relação entre Ichabod e Katrina agarra o espectador muito ao de leve e o mesmo pode ser dito do nosso interesse pelo destino de quem quer que seja. O potencial da força dramática é atenuado. Os melhores momentos de «Sleepy Hallow» são os flashbacks de Crane enquanto criança, onde figuram os seus pais, com a obrigatória presença de Lisa Marie, esposa de Burton. A atmosfera desses curtos minutos intercalados ao longo do filme não se compara com nenhum outro momento daquilo que é a linha narrativa de Sleepy Hollow. Conclusão: bom entretenimento num filme que vale sobretudo pela imagem.

***1/2
classificações

Publicado on-line em 19/3/00.