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Os Outros/Los Otros/The Others
Realizado por Alejandro Amenábar
Espanha/EUA, 2001 Cor – 104 min.

Com: Nicole Kidman, Fionnula Flanagan, Christopher Eccleston, Alakina Mann, James Bentley, Eric Sykes, Elaine Cassidy, Keith Allen, Renée Asherson

Jersey, 1945. A 2ª Guerra Mundial terminou recentemente e Grace (Kidman) vive com os filhos, numa grande mansão vitoriana. O marido partiu para a guerra e não deu quaisquer sinais de vida desde o final do conflito. As crianças, Anne (Mann) e Nicholas (Bentley) sofrem de uma rara doença que os impede de estarem sob luz directa do sol, pelo que a casa permanece envolta em trevas, dia e noite. Uma vez que os antigos criados desapareceram sem deixar rasto, Grace decide contratar outros. Após uma série de ocorrências estranhas, ela começa a acreditar que a velha casa poderá estar assombrada.

«Los Otros», a terceira longa metragem de Alejandro Amenábar e a sua primeira com fundos americanos, tem produção executiva de Tom Cruise que, entretanto decidiu produzir um remake do anterior filme de Amenábar, «Abre los Ojos», com a nova namorada, Penelope Cruz, no principal papel (a repetir o mesmo papel do filme original). Tendo em conta que Hollywood faz remakes porque legendagem ou dobragem é mau para as bilheteiras, não vale a pena criar grandes expectativas em relação a «Vanilla Sky» (2001), antes se sugere que se gastem energias (e dinheiro) para tentar conhecer «Thesis» (1996) e «Abre los Ojos» (1997).

«Os Outros» vem uma vez mais demonstrar que é de fora de Hollywood que surgem as propostas mais válidas no campo do cinema de horror moderno. É certo que a Miramax investiu dinheiro na produção, ao lado da Sogecine e das Producciones del Escorpión, mas a equipa técnica é tão espanhola como a Jersey do filme. Os estúdios americanos tentam capturar o talento e as ideias e, se funcionarem, não pretendem estimular a originalidade de novos projectos, antes se preocupam em fazer remakes e em espremer estilos e temáticas quantas vezes for preciso, até que não dêem mais sumo.

Não é pois de admirar que o horror de produção recente, mais envolvente e convincente, surja de fora do “sistema”. É uma pena que por cá vejamos sobretudo o que a Miramax ou outras produtoras americana decidem comprar ou produzir e não thrillers atmosféricos superiores como «Ringu» (Japão, 1998) ou «Yeogogoedam Dubeonjjae I-Yagi/Memento Mori» (Coreia do Sul, 1999), sendo certo que é com satisfação que vemos aqueles que dominam os mercados mundiais trazerem cinema de qualidade ao circuito comercial (mesmo que tal não seja intencional).

Amenábar assina (argumento, realização e música) um filme “à antiga”, sem efeitos visuais vaidosos, sem sexo ou violência gráfica, criando inquietude e medo com base naquilo que não vemos, no que pode estar escondido nas trevas ou por detrás de uma porta, de onde se ouvem estranhos ruídos. O filme sustém-se largamente no trabalho dos actores, em particular no de Nicole Kidman, sem prejuízo das boas prestações das duas crianças e dos secundários. O argumento não nos faz exclamar “que original!”, existindo semelhanças inegáveis com outros títulos, alguns mais ou menos recentes, mas o que valida esta obra, como se disse, não é o remover das cortinas. O próprio realizador assume a sua intenção de pegar numa história simples (tal como o tratamento visual e formal, que nos remete para cinema de outra época), em contraste com a complexidade das personagens que são o seu motor.

Muito se poderia dizer sobre o comportamento de Grace, mas pouco sem expor demasiado o filme. A personagem que Nicole Kidman agarra magistralmente, esconde-se sob uma lógica definida por dogmas religiosos transmitidos pela sua educação cristã, filtra e delineia a sua realidade com essa base, o que tem paralelo na situação dos filhos, forçados a viverem longe da “luz”. Estes contornos religiosos constituem também uma metáfora sobre o mundo que criamos ou que criam em nosso redor e do qual aceitamos, sem contestar, as regras, e que nos levam a rejeitar a hipótese de outras “realidades”.

A nomeação da “estrangeira” Kidman para os prémios Goya (melhor interpretação feminina) gerou algum zunzum no país vizinho (poderíamos perguntar porquê, se nas salas espanholas ela até fala num castelhano perfeito). «Los Otros» foi ainda nomeado em outras 13 categorias, incluindo filme, realizador, guião original e fotografia. Os pequenos Alakina Mann e James Bentley foram também nomeados na categoria de actor e actriz revelação.

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Publicado on-line em 16/01/02.