cartaz
comentários
coluna
secção informativa
favoritos
arquivo

index

Raparigas de Sucesso/Career Girls
Realizado por Mike Leigh
França, 1996 Cor - 97 min.
Com: Katrin Cartlidge, Lynda Steadman, Mark Benton, Kate Byers, Andy Serkis, Joe Tucker, Margo Stanley, Michael Healy

Annie (Steadman) volta a Londres para passar um fim de semana com Hannah (Cartlidge), sua companheira de quarto dos tempos da faculdade, a qual não via desde há seis anos atrás. Juntas, passam dois dias a recordar os tempos passados e reencontram algumas caras familiares.

Os filmes de Mike Leigh terão sempre algum interesse, porquanto, com maior ou menor sucesso, são produtos de técnicas particulares de desenvolvimento das personagens e do guião. Devemos sempre esperar algumas excelentes representações por parte do elenco, uma vez que cada actor é levado a estudar e a desenvolver o seu personagem - a ser posteriormente integrado na concepção geral de Leigh -, e os seus diálogos e o comportamento possuem uma marcante naturalidade e especificidade tal que podemos ler frases soltas e atribuí-las ao personagem respectivo, sem grande dificuldade. Leigh também tem uma forte tendência para apresentar indivíduos com tiques exacerbados. Em «Segredos e Mentiras», era o caso do namorado que andava como um caranguejo, mas aqui todas as personagens principais são de tal forma histriónicas que poderiam ser apontados no meio de uma multidão. Se não estivessem já separados.

Annie e (sobretudo) Ricky (Benton) parecem necessitar de terapia, devido ao extremo nervosismo que não conseguem esconder, e que, no caso dele, parece caminhar próximo da esquizofrenia. Ambos olham para baixo quando falam com terceiros, e, enquanto ela trepida por todos os lados, ele é a imagem da passividade, falando lentamente, com muitas pausas e emanando diálogos no limite da ininteligibilidade, resultante do modo abafado como se expressa, ou da mera incompreensibilidade, devido aos aparentes saltos de contexto, qual agulha de gira-discos feita canguru sobre um disco de vinil. No filme, claro, o disco seria de The Cure, que são também usados para ilustrar as diferenças entre o tempo passado e o tempo presente, ou o caminhar para uma certa "normalidade", por parte das duas raparigas. Hannah, por seu lado, é a personagem mais forte e emocionalmente estável, mas que se expressa com alguma agressividade, cujas origens se parecem confinar a meros problemas familiares. No tempo presente, Annie e Hannah, são mulheres muito diferentes. No caso de Annie, sempre que há um corte de um flashback para o tempo presente, Lynda Steadman parece ser duas actrizes diferentes.

O mecanismo de fazer depender os reencontros da pura e simples coincidência é um pouco contraproducente em relação ao tom "realista" do filme (e da obra de Leigh em geral). Pôr os personagens a exclamarem "não é espantoso como isto pode suceder?!", não é atenuante. Também é de registar que o tom geral é mais de drama do que de comédia, apesar do trailer sugerir o contrário, compilando os momentos mais divertidos.

(O título nacional de «Career Girls» denotará uma certa boa vontade, mas não é por isso que se pode considerar ajustado. A "carreira" pode ou não ser bem sucedida e o sucesso não é propriamente o mais notório, antes pelo contrário, já que Annie, por exemplo, está descontente com o emprego e deseja mudar.)

Entretanto, talvez fosse uma boa altura para repor «Naked».

***1/2
classificações