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Jogos de Prazer/Boogie Nights
Realizado por Paul Thomas Anderson
EUA, 1997 Cor - 155 min. Anamórfico
Com: Don Cheadle, Heather Graham, Luis Guzmán, Philip Baker Hall, Thomas Jane, Ricky Jay,William H. Macy, Alfred Molina, Julianne Moore, Nicole Parker, John C. Reilly, Burt Reynolds, Robert Ridgely, Mark Wahlberg

San Fernando Valley, 1977. Jack Horner (Reynolds) é um realizador de filmes pornográficos, em que a sua mulher, Amber Waves (Moore) costuma ser a estrela. Horner almeja acima de tudo a qualidade, trabalhando para que o público não deixe a sala antes do filme terminar. Eddie Adams (Wahlberg) tem 17 anos e trabalha na cozinha de um bar nocturno quando é "descoberto". O seu primeiro teste é com Rollergirl (Graham), uma rapariga também muito jovem e que não tira os patins por nenhum motivo. A entrada da década de 80 virá alterar o estado das coisas; surge o vídeo, a que a indústria se terá que adaptar e alguns personagens caminham cada vez mais à beira do abismo.

«Boogie Nights» segue o percurso de um grupo de pessoas ligadas ao cinema porno, desde o auge das salas de cinema até à transição para o vídeo, como o meio por excelência para a sua produção e comercialização. Paul Thomas Anderson emprega bem as duas horas e meia de filme no desenvolvimento de personagens, com as quais claramente se preocupa, o que acaba por ser um dos grandes trunfos da sua obra.

Eddie quer ser uma estrela, e para ele parece ser indiferente ser Bruce Lee ou um famoso actor porno. Horner acredita genuinamente que pode executar um bom produto, com valor artístico, e resiste contra o vídeo. (Mais tarde ouvimo-lo dizer ironicamente, conformando-se, algo como "pela primeira vez em filme… em vídeo). Eddie - que passará a ser Dirk Diggler - e Rollergirl não parecem passar de duas crianças abandonadas, recolhidas por uma família substituta, com o único pormenor dessa família se dedicar à pornografia. Amber é uma verdadeira mãe de todos, principalmente porque a custódia do filho lhe foi retirada. O trabalho de Julianne Moore é irrepreensível, prevendo-se que em breve deixe de ser abordada na rua por pessoas que lhe perguntam se é a Gillian Anderson.

«Boogie Nights» alterna drama com humor, sem pôr de parte ironia q.b.; a juíza - símbolo da respeitabilidade social? - que retira o filho a Amber, é representada pela actriz porno Veronica Hart. «Goodfellas» de Scorsese é uma referência auto-consciente. A sequência na casa do traficante de droga (Molina) está ao nível de bons momentos de tensão desse filme (antes de um previsível tiroteio violento). Anderson utiliza longos planos-sequência a abrir e a encerrar (a apresentação dos personagens e a conclusão do filme), e usa mecanismos de fast-forward para aproximar rapidamente a câmara dos actores, em cenas onde não há tempo a perder, em vez de cortar para o enquadramento desejado, com óbvia conexão com o comando do leitor de vídeo que o espectador de cinema (… de vídeo) tem na mão. O realizador e argumentista afirma que o porno de hoje, em que o espectador carrega no botão de fast-forward até chegar à acção, manifesta-se na generalidade dos filmes que se vão fazendo, em que os produtores, conscientes do aparelhinho nas mãos do consumidor, não admitem que se perca tempo com detalhes que possam levá-lo a premi-lo (detalhes como um argumento, diálogos, etc.)

Ao escrever o guião, Anderson optou pela repetição dos diálogos característicos dos filmes para adultos, de forma a que atingissem um grau de caricatura e o espectador começasse por achar graça, mas acabasse a considerá-los chatos e repetitivos, mas o sistema de classificação norte-americano meteu-se uma vez mais no caminho e uma série de cortes foram impostos. Não deixa de ser irónico que por cá não existam organismos que filtrem as imagens que chegam ao espectador, mas se persista em censurar a linguagem, reduzindo o calão na tradução e legendagem, de que é apanágio a utilização continuada da palavra "verga", mais ridícula por se sugerir que a tal utilização é muito frequente e natural. Lamenta-se esta alteração substancial ao conteúdo do filme e ninguém deverá aceitar pacificamente que os tradutores possam ter o poder de o fazer. Pode-se alegar que o filme permanece inalterado, mas tal não é verdade para o espectador sem um conhecimento mínimo da língua original.

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