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Blade
Realizado por Stephen Norrington
EUA, 1998 Cor - 120 min. Anamórfico
Com: Wesley Snipes, Stephen Dorff, Kris Kristofferson, N'Bushe Wright, Donal Logue, Udo Kier, Traci Lords, Arly Jover, Kevin Patrick Walls, Tim Guinee

Em 1967, uma mulher ferida, esvaindo-se em sangue, dá à luz. Trinta anos depois, Blade (Snipes) é apresentado como um ser híbrido, um vampiro que pode caminhar à luz do dia e que usa os seus poderes para exterminar a "raça pura". É ajudado pelo experiente "mestre", Whistler (Kristofferson). Blade irá cruzar caminhos com uma competente hematologista (Wright), com algumas sugestões práticas sobre métodos de combater a "doença". Frost (Dorff) é um vampiro rebelde farto do "sistema". Procurando dominar a raça humana, estuda arduamente as "antigas escrituras", ao mesmo tempo que conspira contra os líderes da sua raça. Só há um obstáculo a ultrapassar.

"Blade" e o "diácono Frost" nasceram nas páginas das revistas de banda desenhada editadas pela Marvel Comics. O contacto com a fonte original é assegurado pela presença de Stan Lee como produtor executivo.

Muitas produções recentes made in USA esforçam-se por mostrar que a "tradição" já não é o que era, e este filme não é excepção. Claro que, gradualmente, ir contra a tradição torna-se a tradição. Há algumas inovações em relação aos clássicos métodos de matar vampiros e as já obrigatórias lições à audiência, explicando que nem tudo o que se vê "nos filmes" é "real". Algumas ideias funcionarão (injectar alho líquido), outras nem por isso, como os protectores solares, já parte integrante da premissa do western vampiresco «Vampiros em Fuga/Sundown: The Vampire in Retreat» (1991). Na mesma altura em que estreava o referido filme, o argumentista de «Blade», David S. Goyer, escrevia um argumento sobre bonecos assassinos para Charles Band, rei dos filmes - de - horror - baratos - rodados - num - país - de - leste - em - meia - dúzia - de - dias.

O filme de Stephen Norrington começa por caminhar em boa direcção. Aparenta ser um bom filme de acção sobrenatural, com muito movimento, repleto de exageros cartoonescos no que toca à violência gráfica. Mas, da mesma forma que efeitos digitais caros continuam a não nos afectar muito, por comparação com efeitos de maquilhagem ou mecânicos mais baratos e imaginativos, o fraco texto, a caracterização dos personagens simplista e o tom leve e descontraído, misturado com desmembramentos e sangue (computadorizado) a rodos, comprometem a integridade do filme, mesmo quando nunca se poderia esperar algo mais do que um produto sem pretensões para lá do entretenimento. Há situações tão convenientes como o logotipo da Apple que nunca se vira de cabeça para baixo no cinema. O modo como se insere o personagem feminino na narrativa não é justificado de forma minimamente satisfatória, e temos também os "mortos à chegada", que telegrafam o seu fim quase de imediato, restando-nos apenas aguardar por esse momento. Como mandam as regras, há um que terá de morrer a meio e outro que cumpre a "missão" mesmo antes do clímax.

«Blade» suga alguma cinematografia oriental, como muitos filmes de acção americanos recentes têm feito. O mercado americano vai usando fórmulas que resultam noutros territórios, adaptando-as, o que tem estado na origem da "importação", com maior ou menor sucesso, de realizadores de Hong Kong (John Woo é o mais óbvio, o mais influente e o mais respeitado), ou na utilização de actores que "condimentam" blockbusters ocidentais, como Michelle Yeoh em «007» ou Jet Li em «Arma Mortífera». Até Sammo Hung tem agora uma série de TV de artes marciais nos EUA. Voltando ao filme que, por coincidência tem o mesmo nome de uma obra recente de Tsui Hark («Dao/Blade»; «Espada de Sangue» em vídeo nacional, numa cópia atroz, dobrada em inglês), há também alguns elementos fugazes do género japonês de gangsters/Yakuza, patente no modo como a organização dos vampiros é apresentada e, claro, na própria arma que remete para os guerreiros samurai. Estas componentes são reforçadas com o recurso a duplos ou figurantes chineses e japoneses.

Os diversos modelos de acção estão, de um modo geral, bem mesclados. O produto está bem coreografado e filmado. No entanto, algo que aqui não se mistura bem é a ciência e o oculto. Tenta-se construir um universo realista, recorrendo-se a explicações científicas que tentam soar verosímeis, mas depois não só se prepara um clímax místico já algo déjà vu (e não só porque não podemos deixar de recordar «Os Salteadores da Arca Perdida» (1981)), como estes elementos são colocados ao mesmo nível dos "científicos", com os quais interferem inconsistentemente. Há algo, perto do final, que faz tanto sentido como atacar um espírito com poluição atmosférica, e que, desse modo, vem dizer que o argumento não tem importância alguma e só serviu para nos manter sentados durante duas horas.

O filme de vampiros sempre teve um pendor erótico, cada vez menos subtil ao longo das décadas. «Blade» apresenta algumas vampiras sexy q.b., encena algumas sequências semi-provocantes, mas depois retrai-se. Próximo do final, adiciona-se um momento onde não se percebe se se procura a comédia ou o erotismo, mas fracassa-se em qualquer desses campos. O excessivo à-vontade na apresentação da violência contrasta com alguma insegurança e timidez no retratar do sexo vampiresco. Por outro lado, a participação activa das ajudantes do Diácono é relegada para segundo plano porque o filme centra-se demasiado na persona de Wesley Snipes. Os personagens femininos permanecem elementos decorativos e "donzelas em perigo", algo que se perde na tradução do cinema de acção vindo do Oriente, onde as mulheres têm frequentemente a possibilidade de ser tão violentas, perigosas e viciosas quanto qualquer elemento do sexo "forte".

**1/2
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