De tempos a tempos surgem discussões sobre os benefícios
da dobragem, normalmente para encher "dossiers" de jornais
ou revistas, ou porque alguém se lembra de trazer o assunto
à baila. Felizmente nunca surgiu no âmbito de um
real processo de intenções de alterar o actual sistema.
As vantagens que se apontam à dobragem são a possibilidade
de alcançar mais público ou dar trabalho a actores,
técnicos, etc. Os seus defensores apontam sempre a grande
desvantagem da legendagem: é impressa opticamente na película
e cobre a imagem. E é verdade. A questão passa por
pesar as vantagens e as desvantagens de ambos os métodos.
Antes de mais, confunde um pouco que pessoas que em outros campos
defendem a integridade do cinema enquanto arte, defendam a dobragem
baseando-se em critérios meramente economicistas ou na
defesa de minorias - grosso modo os analfabetos - que não
se desejam preservar, mas sim eliminar.
Desvantagens da dobragem:
- elimina as vozes originais dos actores, cujas nuances fazem
parte da representação;
- cria situações irreais em que um japonês,
um francês e um inglês surgem todos a falar a mesma
língua, por vezes com pronúncia;
- elimina o acesso ao texto original, impedindo confrontar más
traduções ou melhorar a aprendizagem da língua
(no caso de trocadilhos de tradução impossível,
nem quem percebe bem ou parcialmente a língua os pode perceber);
Vantagens:
- permite a compreensão do filme por todos os nativos do
país, incluindo analfabetos ou pessoas com dificuldades
de leitura;
- não cobre a película.
Desvantagens da legendagem:
- tapa uma faixa da imagem;
- desvia a atenção para a parte de baixo da película.
Vantagens:
- não altera em nada o som original do filme e permite
o acesso integral ao desempenho dos actores;
- é mais natural e lógico: ingleses falam inglês,
japoneses japonês, etc.;
- quem tenha conhecimentos da língua original pode confrontar
o texto original quando a tradução é impossível
ou mal feita.
As desvantagens da legendagem - na nossa opinião o mal
menor -, podem ser colmatadas na exibição televisiva
e edição videográfica. Respeitando o formato
natural dos filmes, e utilizando legendas apropriadas (ou seja
o oposto das letras grandes, carregadas e a dois espaços
das edições Prisvídeo), o texto, na grande
maioria dos filmes, ficaria alojado no espaço negro abaixo
da imagem. Os coloridos logotipos das emissoras também
ficariam fora da imagem, acima.
Em países como o Reino Unido a consciência deste
facto contribuiu desde há muito para a emissão de
filmes legendados em formato original (esses são, num país
de língua oficial inglesa, evidentemente em número
reduzido).
Em relação à exibição cinematográfica,
infelizmente, existem casos em que a legendagem cobre
parte importante da imagem. Na maioria dos casos esse problema
poderia ser resolvido por maior atenção de quem
legenda o filme.
Como os filmes são enquadrados no projector (cobrindo-se
imagem filmada mas que não se destina a ser vista), havendo
vontade dos distribuidores podia-se conceber um sistema em que
se legendava fora do enquadramento planeado para o filme, num
paralelo com o melhor cenário possível em vídeo/TV.
Esta possibilidade é tão evidente e tão simples
de concretizar, que apenas se justifica que o não tenha
sido devido aos grandes mercados serem anglófonos, com
um número reduzido de filmes legendados, e que outros como
a França, Espanha ou Itália prefiram as dobragens.
Algumas concessões teriam de ser feitas. Possivelmente
existem filmes que dobrados até ganhariam algo, ou pelo
menos não perderiam muito. É o caso de muitos filmes
italianos, alemães, ou co-produções com actores
de diversos países, falando línguas diferentes e
dobrados em pós-produção. Não ouvimos
a voz de Philipe Noiret em «Cinema Paraíso»,
mas sim a de Vittorio de Prima.
Ainda assim parece ser preferível ver um filme italiano
com péssima sincronização de vozes, já
que tal é uma característica desse filme, e à
dobragem não compete qualquer espécie de papel corrector.
Tal como Philipe Noiret dobrado por de Prima é uma característica
do filme referido. Acrescente-se o estranho que seria um filme
como «Os Olhos da Ásia» (independentemente da
qualidade, ou falta dela, que lhe subjaz), falado em português,
japonês, francês, inglês e espanhol, dobrado
numa só língua.
Deste modo parece-nos preferível, sempre, a legendagem.
Requer-se, claro - como em tudo - um trabalho bem feito. E, como em tudo também, não nos repugnaria a proliferação de filmes dobrados se se mantivesse o acesso às versões legendadas, o que, como prova a situação referente a filmes widescreen/fullscreen, seria tendencialmente inviável devido à exiguidade dos mercados, e à pouca vontade do público em geral de escolher seja o que for.
6/97